Memórias

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“Deve ser horrível — diz você — o escândalo em torno de nossa memória. O homem arrastado ao pelourinho do escárnio público e ao pasto da maledicência, deve ser uma fogueira de angústia para o coração acordado, além da morte.”


Você tem razão. A ave, em pleno céu, que se visse constrangida a voltar à casca do ovo, ou a árvore luxuriante que fosse obrigada a retornar para a cova de lodo, sofreriam menos que a alma desencarnada, sob a intimação de regresso às perigosas infantilidades da experiência humana.

Em tais circunstâncias, laços mais pesados nos religam o espírito, com mais intensidade, à gleba da carne, e a voz dos nossos julgadores, não raro, nos converte os ouvidos em receptores gigantescos para os quais convergem todos os apontamentos justos ou injustos de quantos nos apreciam a conduta e as decisões.

Você já pensou num homem, cujo corpo seja uma chaga viva, tangido violentamente por milhares de mãos descaridosas e rudes?


Esse é o símbolo pálido com que ousamos qualificar o suplício do infortunado que lega aos contemporâneos as recordações da própria viagem pela Terra, quando essas memórias se referem às situações que fazem o inferno dos seus semelhantes.

Fustigado por reclamações e acusações infindáveis, o morto- vivo, com a infelicidade desse jaez, sofre golpes desapiedados, a torto e a direito, à maneira de um ferido na praça pública, visitado pelos sopapos e pelos impropérios de toda gente.

E você não calcula o que seja o martírio trazido pela impossibilidade de qualquer esclarecimento digno! (...)

Creia você que, em verdade, tudo isso é terrível e doloroso, de vez que o arrependimento irremediável nos transforma em duendes infortunados, em aflitiva peregrinação.

Não admita, porém, que isso seja apenas lamentável privilégio de alguns.

Não é necessário fixarmos reminiscências da Terra, em bronze ou papel, para que a vida nos revele aos outros tais quais somos.

Trazemos conosco o arquivo que nos é próprio. Sentimentos e ideais, palavras e ações são marcas em nossa alma.

Todos alcançaremos o plano em que nosso espírito é um livro aberto.

Intenções ocultas, interferências nos destinos alheios, assaltos disfarçados à felicidade do próximo, crimes consagrados pela admiração do mundo, misérias íntimas e desequilíbrios morais aparecem claramente, espantando a nós mesmos, que não suspeitávamos, de leve, da nossa própria degradação.

Você que conhece tão bem o assunto, cuide dos seus passos e vele pelo futuro de sua alma eterna, porque a existência, meu caro, seja onde for, é sempre um livro que o nosso coração anda escrevendo.



Autor: Irmão X
Do Livro: Sentinelas da Luz.

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